Um (quase) conto: HISTÓRIA DE INVERNO

      "Descruze esses braços, menino. Vamos, faça um novo desenho", dizia Dona Constância em uma manhã fria de inverno. O meu plano para aquele dia foi duramente engavetado. "Queria jogar bola", respondi tristonho. "Oras, jogue aqui dentro". Não entendi a fala da vovó naquele instante. Então, genuinamente ela olhou para o papel, orientando-me com apenas um olhar.

      O dia mal acontecia e eu já estava sobre a mesa com papel e lápis nas mãos. Dona Constância deu-me um beijo no rosto, como fazia religiosamente em todas as manhãs, e, enquanto passava o café, olhava-me com olhos maternos. "Muito sol por aí?", perguntou-me. Respondi com um sorriso tímido por entre os dentes. A partir daquele instante, parecia que um lindo sol se abria no meu céu que estava há tempos nublado. Naquele milésimo de segundo, comecei a compreender muitas coisas e, então, dei início a desafiadora tarefa de decifrar os ensinamentos de vovó.

      Esse foi o começo de tudo, então, lâmpadas acendiam e piscavam a cada olhar, a cada conversa, a cada sorriso. Aprendi com o que fui, com minhas ações e meus escorregões. Dona Constância fez-me acreditar que o ser humano pode ser moldado, melhorado e refeito. Feito a argila, sabe?

Por Nina

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